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DAS MEDIDAS PROVISÓRIAS 340 E 451, INVOLUÇÃO DO SEGURO DPVAT - 18/02/2011

Inicialmente, destaca-se que o legislador procurou amparar o acidentado de trânsito em seu momento de infortúnio de forma objetiva, rápida e sem burocracia. Baseado em estatísticas, nas características sociais da maioria das vítimas de acidente de trânsito, via de regra eram pessoas pobres e excluídos socialmente e, finalmente, na imensidão e diferentes regiões do país formulou a Lei 6194/74, sem no entanto descurar da segurança, com simplicidade em suas exigências para o acesso às indenizações. Nesse contexto o ordenamento legal do DPVAT é cristalino, faça-se a prova de que houve o acidente de trânsito, pelo Registro de Ocorrência; e comprove-se que desse acidente resultou na vítima, condutor, passageiro ou pedestre, a morte ou a invalidez permanente guarde nexo com o  acidente  havido[1].
 
A simplicidade para a montagem do processo para alcançar a indenização devida foi substituída pela feroz burocracia, extra legis implantada pelo gestor do DPVAT. A agilidade pretendida para rápida minimização do desconforto da vítima ou de seus beneficiários foi sobreposta pela utilização de subterfúgios que visam a procrastinação para liquidação do sinistro. A forte preocupação social que permeia a legislação vigente, seu alcance aos desvalidos, seu acesso simplificado, é dificultado pelo sistemático e permanente silencio sobre a existência da Lei e pela total ausência da sua divulgação nos meios de comunicação, ampliando esta dificuldade foram assinadas as Medidas Provisórias 340 e 451, que alteraram gradativamente o seguro em destaque.
 
O Seguro Obrigatório de Danos Causados por Veículos Automotores (DPVAT) é um seguro social, ou seja, tem a finalidade única e exclusiva de minorar a dor em um momento de perda ou trauma. Não tem o condão de funcionar como verba indenizatória ou reparatória, mas tão somente ajudar o necessitado em momento do infortúnio.
 
DAS MEDIDAS PROVISÓRIAS 340 E 451, INVOLUÇÃO DO SEGURO:
 
 
        Neste capítulo abordaremos os aspectos jurídicos das medidas provisórias 340 e 451, ambas convertidas nas leis nº 11.482/2007 e 11.945/2009, e suas implicações ao seguro DPVAT. Referidas leis trouxeram algumas modificações na lei que regula o seguro obrigatório em comento, alterando vários dispositivos, de estrema importância ao seguro DPVAT. Veremos minuciosamente os artigos atingidos pelas leis, suas alterações e as modificações que elas acarretaram no seguro obrigatório.
       
        As modificações introduzidas a partir de 29 de dezembro de 2006 prejudicaram as vítimas e seus beneficiários, tanto no aspecto econômico, com a redução dos valores das indenizações, como na dificuldade para o processamento do processo administrativo.
 
        Mais uma vez, estamos diante de uma atitude que carece de maior relevância com o fato de o legislador disciplinar de um tema de extrema importância à população, através de resoluções ao revés da utilização de lei ordinária. Neste sentido faremos uma análise sobre as medidas aprovadas, sobre sua possível inconstitucionalidade e de uma maneira geral de como a lei de Seguros está sendo tratada em nosso País, pois leis que versão sobre temas absolutamente estranhos ao seguro como de ordem tributária, cuidam de um tema de extrema relevância como é o caso do seguro DPVAT.
 
As duas medidas provisórias convertidas em lei são muito parecidas, não por seu conteúdo, mas pela sua forma, pelas suas incidências ao seguro e bem como pelas transformações que acarretaram ao seguro em comento. Ambas vieram de carona em medidas provisórias voltadas principalmente em reforma tributária, nenhuma tinha necessidade ou urgência, pelo contrário, e as duas trouxeram um enorme favorecimento as seguradoras e um enorme prejuízo aos segurados.
 
Primeiro foi alterado o valor da indenização, após o STJ confirmar a legalidade da indenização por salários mínimos, depois dificultou o acesso dos assegurados as indenizações para cobrir as despesas médicas e graduou a indenização conforme a extensão da lesão e o membro machucado, quando a maioria dos tribunais pátrios graduavam a indenização em seu grau máximo independente do membro lesionado. Dito disso, passamos a destacar cada uma em separado, demonstrando as alterações ocasionadas ao seguro obrigatório.
 
 
Nova indenização ao seguro DPVAT com a MP 340 DE 2006:
 
 
Em 29 de dezembro de 2006, quase na virada do ano, uma Medida Provisória com teor majoritariamente tributária foi assinada. Entre artigos que envolviam matérias complexas como previdência social, imposto de renda pessoa física, COFINS, foi inserido dois artigos que mencionavam sobre o seguro DPVAT, referida reunião de assuntos totalmente estranhos entre tinha evidente intuito de serem aprovadas sem discussão pelo Congresso Nacional. Referidos artigos alteraram a indenização do seguro DPVAT, o que ocasionou ao longo de curtos anos um evidente prejuízo aos segurados e um enorme benefício às seguradoras.
 
O legislador em 1974 foi muito feliz ao fixar a indenização em salários mínimos. Assim, tornou perene e sem necessidade de permanente atualização da Lei. Entendeu que o acidente é fortuito e que ao explicitar a indenização em salário mínimo não a estava indexando e sim a quantificando e a tornando atemporal, principalmente combatendo a inflação. Não feriu e não fere o preceito constitucional que veda a utilização de indexadores com base no salário mínimo.
 
Voltaire Martins[2]destaca em sua obra que as seguradoras sempre criticaram referido dispositivo legal, e por não acreditarem no mesmo não o aplicavam, chacoteando a vítima. Ao lançarmos os olhos nos últimos anos veremos que mais de 1.000.000 (um milhão) de vítimas tiveram seus direitos subtraídos, pela constante desobediência do mercado a legislação vigente. Sob o manto de obediência ás normas baixadas pelo CNSP, o Convênio DPVT, pagava os valores estabelecidos nas resoluções emanadas daquele órgão que, em flagrante desrespeito  a Lei  6194/74.
 
A divergência chegou ao STF, ADPF/95 - 2006, que negou a liminar requerida para o afastamento do Salário Mínimo como quantificador, pouco depois de publicado acórdão que afirmou a constitucionalidade do art. a medida provisório foi assinada.  O referida matéria foi também foi apreciada pelo STJ[3], que manteve a mesma decisão do STF, em declarar constitucional a indenização de 40 salários mínimos.
 
Rafael Tárrega Martins lembra que:
 
 “Mais de todas as oportunidades que tivemos para debruçarmos sobre o tema, esta sem dúvida foi a mais difícil. E é que o seguro obrigatório já não é o mesmo. Os últimos anos foram complicados para esse importante seguro social, dado que duas medidas provisórias alteraram de forma sensível um ponto capital do instituto, como é o caso das indenizações - e não necessariamente para melhor. Como é natural, a cada nova norma se abre uma brecha entre dois momentos distintos, um anterior e outro posterior à vigência da regulamentação criada. Isto invoca noções de direito intertemporal que devem estar presentes na análise global do instituto” [4].
 
A Medida Provisória 340 de 2006, além de misturar vários ramos do direito, alterou, especificamente em seu artigo 8º, a legislação que regula o seguro DPVAT. Referida medida foi assinada com o intuito de alterar a verba indenizatória do seguro em comento, deixando de ser cálculo sobre um valor variável para ser imposto um número fixo e rígido. Ou seja, a medida tanta retroagir a Lei 6194/74, para voltar a termos uma indenização já impostas aos nossos filhos e netos. Depois deste arrazoado fica fácil de verificarmos como a lei retroagiu, abata olharmos para a antiga legislação em que quantificava a indenização em seis mil cruzeiros novos, o que hoje é incompreensível. O que será R$13.500,00 (treze mil e quinhentos reais) em trinta anos? será que teremos outro valor incompreensível ou teremos um valor muito aquém do que deveria ser a indenização? fica a indagação.
 
Como já foi exposto neste trabalho a lei que regulava o seguro obrigatório no Brasil, aplicava em seu texto legal um valor fixo para as indenizações em caso de morte, invalidez permanente ou parcial e em casos de dano material. Ocorre que sabiamente o legislador consciente de que não há como impor um valor fixo, arbitrou em 1974 a quantificação com base no salário mínimo, assim, o valor nunca seria defasado ou desproporcional ao longo do tempo. No entanto em 2006, no meio de várias disposições, em diferentes ramos do direito, um artigo alterou o valor da indenização do seguro DPVAT.
 
Referida medida foi convertida em 31 de maio de 2007 na Lei nº 11.482. Além das considerações feitas, outros aspectos da lei são relevantes e não podem ser esquecidos por este trabalho. O artigo 8º dessa nova lei, que alterou o artigo 3º, da Lei 6.194/74, a qual dispõe sobre seguro obrigatório DPVAT, é considerado, por muitos doutrinadores como legisladores, inconstitucional, como se demonstrará seguir.
 
Conforme ensinamento majoritário da doutrina sobre a matéria referida lei possui inúmeros erros, conforme veremos ao longo deste capítulo. A Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, dispôs sobre a elaboração, redação e consolidação de leis, cuidando, em síntese, de técnica legislativa.
 
O art. 7º desta norma complementar está assim vazado:
 
O primeiro artigo do texto indicará o objeto da lei e o respectivo âmbito de aplicação, observados os seguintes princípios:
 I – executadas as codificações, cada lei tratará de um único objetivo.
II – a lei não conterá matéria estranha a seu objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão.
 
Assim, além de o sobredito diploma legal carecer de alta qualificação técnica-legislativa, o legislador desta lei ordinária não observou a gradação do processo legislativo, ex vi legis, do disposto no artigo 59 da Constituição Federal.
 
Voltaire Giavarina Marensi, explica que a Lei Complementar, de hierarquia maior que a lei ordinária, porque requer quorum congressual de aprovação mais expressivo – proíbe à norma legal comum tratar de matéria diversa na mesma lei. Logo, há, no seu sentir, inconstitucionalidade formal do artigo que modificou a regra anterior sobre o seguro obrigatório. Não é crível que os legisladores teimem em fazer modificações em leis que se tornem ou, quem sabe, o que não se acredita, totalmente à sorrelfa do cidadão, desprovido, ainda dos mais elementares e comezinhos princípios exigidos pela técnica legislativa, o que é totalmente deplorável.[5]
 
A Lei ora em comento versa sobre um emaranhado de matéria totalmente estranha ao seguro DPVAT, ou seja, conforme já destacamos neste trabalho as alterações referentes ao seguro foram embutidas na Medida Provisória sem nenhuma justificativa ou relevância, por isso, alem do seu conteúdo tem que ser combatida por seu atecnia, pela ausência de esclarecimento ou conexão com a matéria relevante da Medida Provisória.
 
Referido Autor acrescenta que o seguro, principalmente o seguro DPVAT, é importante segmento do mercado que precisa ser esclarecido cada dia mais à população. O seguro em comento apesar de suas enormes demissões em razão do número de veículos que circulam em todo pais e o números assustador de acidentes que ocorrem a cada dia, no entanto o seguro tem se consolidado como um ilustre desconhecido, tanto pela população como para muitos operadores do direito. Isso ocorre, não só pela mínima divulgação, mas pelo desconhecimento de sua norma, que atualmente está dispersa em diplomas sem afinidade, pertinência ou conexão, ao invés de ser destacado o texto legal em pauta, o mesmo se encontra escondido neste mal elaborado cipoal legislativo.
 
A Constituição Federal delimita o poder do Estado, assegurando o respeito não só aos direitos individuais (normas materiais) como ao processo legislativo (normas formais), cujas leis não podem ser elaboradas em desacordo com a constituição, sobretudo quando para violar o direito adquirido (art. 5º, XXXVI, CF), nos casos de acidentes ocorridos antes da vigência da nova lei, a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF), o recebimento à justa indenização por ato ilícito (art. 5º, X, CF) e o processo legislativo (art. 62, caput, CF).
 
Inconstitucionalidade é, assim, a incompatibilidade entre um ato legislativo ou administrativo e a Constituição Federal.
 
No caso presente, temos que a Lei 11.482/07, no que diz respeito ao seu artigo 8º, apresenta segundo o entendimento dos autores mencionados vício de inconstitucionalidade desde sua origem, ou seja, na formação no processo legislativo, uma vez que a Medida Provisória que a originou (MP 340/06) não preenche os pressupostos de relevância e urgência preconizados pelo artigo 62, caput, da Constituição Federal, além dos apontamentos acima mencionados.[6]
 
A par destas alterações o texto da lei 6.194/74 que regula o seguro obrigatório, sofreu modificações em seus artigos 4º, 5º e 11º, que tratam respectivamente, da falta de indicação de beneficiário, do prazo do pagamento da indenização, de sua forma, dos juros moratórios, e por fim as penalidades impostas às seguradoras pela inobservância das normas inexas nesse diploma legal.
 
A edição de Medida Provisória deve obedecer os pressupostos constitucionais de relevância e urgência, conforme determinação expressa do artigo 62, caput, da Constituição Federal, e deve ser utilizada pelo Presidente da República em hipótese de absoluta excepcionalidade. O caso em tela só evidencia a urgência das seguradoras em assegurarem o seu lucro após a decisão do STF em declarar constitucional a indenização imposta com base no salário mínimo. Passados apenas 4 anos da referida medida já é visível o prejuízo do segurado, pois a indenização que hoje corresponde a 13.500,00 deveria satisfazer mais de R$20.000,00 (vinte mil reais).
 
Nesse passo, qualquer modificação na Lei 6.194/74, que regulamenta o seguro obrigatório, só poderia ser realizada através do processo legislativo ordinário ou comum, não sendo esse o caso em tela.
 
Ressalte-se que a MP 340/06, que deu origem à Lei 11.482/07, foi editada com a finalidade específica de atualizar a tabela do imposto de renda, correspondendo as demais modificações nela inseridas as denominadas “caronas” na linguagem dos parlamentares, furto de um descaso com o segurado e com a saúde pública em geral.
 
Ora, desde que a Lei 6.194/74 foi criada, essa indenização corresponde a 40 salários mínimos e nunca se ouviu dizer, ao longo de todos esses anos, que as seguradoras participantes do convênio tivessem acumulado algum prejuízo com os pagamentos das indenizações, capaz de colocar em risco suas atividades operacionais de modo a justificar a intervenção do Governo Federal por meio de Medida Provisória. Logo, de se concluir como sendo justa a indenização de 40 salários mínimos fixada pela Lei 6.194/74, pois é a que preserva mais eficazmente a dignidade da pessoa humana, garantia constitucional prevista no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, sendo inconcebível sua redução em prejuízo da sociedade brasileira.
 
Rafael Tárrega Martins ensina que a indenização do seguro obrigatório não representa a medida nem o preço da dor, mas uma compensação, ainda que pequena pela tristeza e sofrimento infligidas às vítimas e familiares de vítimas fatais de acidente de trânsito, não se coadunando com a dignidade da pessoa humana o pagamento de indenização por valor inferior ao estabelecido na Lei 6.194/74 (violação do art. 1º, III, CF). [7]
 
É sabido que o seguro exerce um papel decisivo no esquema de segurança contra riscos da vida, porque a indenização que se paga para cobrir um sinistro previsto serve para recompor o patrimônio do lesado. Os seguros privados não são acessíveis a todos, porque os prêmios que se cobram afugentam a maioria dos interessados. O seguro obrigatório, em funcionamento para acidentes de veículos (DPVAT da Lei nº 6.194/1974), não cumpre essa meta porque a indenização máxima alcança, hoje, R$ 13.500,00, ou seja, os danos, superam este valor[8].
 
Em se tratando de indenização de seguro obrigatório DPVAT, o que se busca não é colocar o dinheiro ao lado da angústia ou da dor, mas tão somente propiciar-se ao lesado uma situação positiva, capaz de amenizar, de atenuar ou até mesmo, se possível, de extinguir nele, a negativa sensação de dor, para tanto pagando-lhe justa indenização, visando, como dito, resguardar o princípio da dignidade da pessoa humana e evitar que haja o enriquecimento sem causa das seguradoras.
 
Pelas razões sopesadas, não há outro horizonte do que a inconstitucionalidade do artigo 8º, da Lei 11.482/07, por violação do artigo 62, caput, artigo 5º, incisos XXXVI e X e artigo 1º, inciso III, todos da Constituição Federal.
 
 
 A MP 451, e suas conseqüências ao seguro DPVAT.
 
 
A MP 451 seguiu o mesmo caminho da Medida Provisória 340, amparou o seguro obrigatório juntamente com outra disciplinas estranhas, no entanto apesar de não estar configurada sua necessidade e urgência foi assinada e posteriormente convertida em lei pelo Congresso Nacional. Novamente o mercado segurador tem uma Medida Provisória que, entre outros assuntos de interesse público incontestável, altera nos artigos 19 e 20 a legislação do DPVAT, em especial os art. 3, II e III e art. 5, parágrafo 5.
 
Referida lei alterou drasticamente a legislação que regula o seguro DPVAT,quando alguém sofria um acidente de trânsito e era levado a um hospital credenciado pelo SUS, tinha o direito de optar pelo atendimento em caráter particular coberto pelo DPVAT, até o devido valor estipulado na Lei (R$2.700,00), referido valor era posteriormente compensado pelas seguradoras aos hospitais, pagamento denominado DAMS. Ocorre que com a referida MP os hospitais credenciados no SUS, mesmo que a instituição disponha de ala particular, terão que obrigatoriamente cobrar essas despesas do Sistema Único de Saúde – ou seja, do Ministério da Saúde, e não das seguradoras, não poderão atender de forma particular os acidentados pelo seguro DPVAT.
 
Outra alteração imposta pela Medida Provisória foi a classificação do dano com a parte do corpo do acidentado, ou seja, a MP graduou o corpo, dependendo do órgão lesado o valor a ser indenizado seria alterado. Assim, a lei quantificou a lesão com relação ao órgão sofrido e lesionado, diferenciado a indenização pela parte do corpo sofrido.
 
No período anterior à nova regra adotava-se um mecanismo jurídico bastante eficaz para tornar acessível o direito ao atendimento médico DPVAT pelas vítimas de assistência de acidente de trânsito, pois as vítimas recebiam socorro e assistência na unidade hospitalar em caráter particular com estrutura e acomodações diferenciadas ao SUS de forma rápida e sem qualquer encargo financeiro. Na alta hospitalar, o paciente ou responsável assinava um termo de cessão transferindo ao estabelecimento de saúde o direito de receber diretamente das seguradoras DPVAT pelo serviço médico hospitalar prestado.
 
Munido dessa cessão de crédito, o estabelecimento de saúde reunia os documentos exigidos pela legislação e também pelo consórcio DPVAT encaminhando-os a uma empresa reguladora que era autorizada, contratada e indicada pelas próprias seguradoras. Aberto o processo de ressarcimento do DAMS, ocorria uma auditoria dos documentos, informações e contas médicas realizada pelo cadastro nacional. Aprovado o processo de ressarcimento do DAMS e decorridos cerca de 45 dias, na prática este prazo poderia chegar a mais de meses, o hospital recebia pelos serviços prestados, sendo remunerados conforme tabela da CNSP.
 
A supressão do 2º parágrafo do artigo 3º da Lei 6.194, de 19 de dezembro de 1974, pelo artigo 20 da Medida Provisória 451, de 2008, busca vedar o reembolso de DAMS (despesas de assistência médica e suplementares) por cessionários quando o acidentado for atendido pelo SUS (sistema único de saúde), ou seja, quando credenciados no SUS, médicos e hospitais, somente poderiam ser remunerados pelo SUS.
 
“Na prática estaremos retirando recursos da saúde pública e transferindo-os para as seguradoras”, explica o deputado Zacharow.[9]
 
A medida, segundo o parlamentar, vai contra o interesse público, e é injusta para com os hospitais credenciados ao SUS, que em sua maioria são filantrópicos ou sem fins lucrativos. “A própria Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais (CNSEG) já informou que a MP vai resultar em uma economia de R$ 260 milhões para as seguradoras. Ou seja, trará um acréscimo em seus lucros dos mesmos R$ 260 milhões. E esse dinheiro vai sair do bolso do contribuinte, que é quem financia o SUS”. O que ocorreu foi a transferência do ônus de aproximadamente 260 milhões de reais por ano aos cofres públicos, visto que as DAMS ficariam com cobertura única do SUS, sistema esse dependente, de forma integral, da receita do Estado.
 
O deputado lembra que praticamente a totalidade dos pacientes acidentados é atendida pelos hospitais filantrópicos. E que a MP, da forma como está redigida, discrimina e prejudica essas entidades que prestam um serviço de inestimável interesse público, em favor das seguradoras e dos hospitais particulares que não atendem pelo SUS.
 
Referida Medida Provisória foi convertida em lei em 04 de junho de 2009, sob o número 11.945/2009. A vedação da cessão de direitos instituída pela Lei nº 11.945/2009, que alterou o art. 3º da Lei nº 6.194/1974, acaba por retirar dos hospitais de trauma, conveniados ao SUS, a possibilidade de terem uma fonte de custeio para tentar equilibrar suas contas, ou seja, retira da própria sociedade uma verba destinada à saúde, direito que deve ser concedido a todos e que há muito não é. 
 
O SUS não exige 100% dos serviços de seus conveniados, exatamente para que eles tenham outras fontes de custeio, ou seja, que exerçam suas atividades com remuneração mais próximas da realidade, e não em tarifas deprimidas impostas pelo Sistema Único de Saúde.     
 
Ocorre que a supressão de uma fonte de custeio, como a advinda do DPVAT, pretende conviver com o comando do art. 196 da Constituição da República, que estabelece ser o direito de todos à saúde garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.       
 
Conforme entendimento do professor Ives Gandra da Silva Martins, podemos destacar que essas políticas, segundo a melhor doutrina, são verdadeiras políticas de Estado, às quais estão subordinados os governantes, independentemente de quaisquer convicções ideológicas ou filiações político-partidárias, haja vista que as ações e os serviços de saúde são de relevância pública (art. 197 da CF).
 
Reconhecendo a dimensão da importância da saúde como direito fundamental, a própria Carta Magna encarregou-se de permitir ao Estado que exercite seu dever de prover a saúde com o auxílio da iniciativa privada, estabelecendo, contudo, preferência em favor das entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos (art. 199, § 1º, da Constituição Federal do Brasil de 1988).
 
Não há como não nos questionarmos, em face ao exposto      se é licito afirmar que as políticas econômicas a que se refere o art. 196 da Constituição Federal de 1988 englobam a promoção e a facilitação da busca de meios de sustentabilidade dos hospitais parceiros do SUS?      Há inconstitucionalidade no art. 31 da Lei nº 11.945/2009, que alterou o art. 3º da Lei nº 6.194/1974, que, ao vedar a cessão do direito de reembolso das despesas médico-hospitalares pelo DPVAT em favor dos hospitais vinculados contratualmente ao SUS, retira destes uma fonte de sustentabilidade econômica? O interesse das empresas de seguro pode ser oposto à oneração do SUS e à preferência constitucional a que se refere o art. 199, § 1º, da Constituição Federal de 1988?
 
Wladimir Novaes Martinez, assim escreve sobre o tema:
 
“De todos os três instrumentos constitucionais da seguridade social, o da saúde surpreende pela extensão da disciplina. São cinco artigos (196/200), programáticos, bem-intencionados, uma verdadeira carta de propósitos, elevados, raramente dispositivos, nem todos auto- aplicáveis, aceitáveis, em suma, deixando livre o legislador ordinário para fixar ao Estado e à iniciativa privada as medidas conducentes a uma futura sistematização do sistema nacional de saúde. Não é estatizante nem privatizante, embora unifique a direção e descentraliza as atividades, visando a um sistema único em relação à União, Estados e Municípios, com a participação da Administração e do administrado” [10]
 
O art. 194 do texto constitucional de 1988 expõe a tríplice faceta da Seguridade Social, realçando a preponderância da saúde, que surge em primeiro lugar, para depois cuidar, o legislador supremo, da previdência e da assistência social.[11]
 
Na composição do orçamento, têm, portanto, indiscutível relevância, sendo, tais contribuições, destinadas à seguridade social - interpreto a Lei Maior e não a legislação infraconstitucional - para atender à saúde, à previdência e à assistência social. A Seção da Saúde principia com o art. 196, que baliza os objetivos da vontade do constituinte, sobre ofertar os princípios que norteiam a participação do Estado em assegurá-los aos que vivem no País, referido art. assim está redigido:
 
“A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”
 
Declara, por outro lado, que “políticas econômicas e sociais” serão destinadas ao objetivo retro citado, assegurando-se “o acesso igualitário” de todos os que aqui vivem “às ações e recursos” para “sua promoção, proteção e recuperação”. Da leitura do dispositivo ressalta-se, de plano, que o princípio da isonomia é assegurado a todos os que aqui residam, sendo dever do Estado e direito do cidadão exigir o cumprimento do dispositivo.
 
Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
 
Neste seguimento afirma Ives Gandra da Silva Martins[12]que certo, todavia, é que, cláusula pétrea ou não, o conteúdo amplo do art. 196 da Constituição Federal de 1988 - que impõe políticas sociais e econômicas para a redução de riscos e agravos daquele que aqui vive - não pode ser diminuído por legislações ordinárias. Se for cláusula pétrea, nem mesmo por emenda constitucional. Se não for, somente por emenda constitucional poderia haver redução das obrigações impostas ao Poder Público em relação ao cidadão e ao residente, relativamente aos direitos que possuía em 05 de outubro de 1988.
 
Evidente que referida lei reduz os direitos do acidentado, pois na maioria das vezes este não tem como pagar pelo atendimento particular, para posteriormente requerer o reembolso da seguradora, assim, qualquer lei que venha a reduzir direitos dos cidadãos e residentes, nitidamente, afasta o princípio constitucional, porque torna a obrigação do Poder Público, em garantir serviços e ações do Estado, menor do que quando da promulgação da Carta Magna.
 
A MP fere o princípio constitucional da isonomia e da livre iniciativa, ao impedir que o acidentado opte pelo atendimento particular no hospital credenciado pelo SUS. Os hospitais privados conveniados ao SUS podem, por exemplo, cobrar dos planos de saúde pelo atendimento prestado aos usuários dos planos privados. Não há sentido em se proibir a cobrança pelos serviços prestados aos usuários do seguro obrigatório.
 
Como se verifica do inciso IV do art. 1º da Constituição Federal de 1988, o regime econômico adotado é o da livre iniciativa. Esse princípio é reafirmado no Capítulo I do Titulo VII, que cuida dos princípios gerais da atividade econômica, enumerados nos inciso I a IX do art. 170. A livre concorrência aparece no inciso IV, constituindo-se na espinha dorsal do regime econômico adotado. O parágrafo único, do art. 170 assegura o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de prévia autorização dos órgãos públicos, ressalvados os casos previstos em lei.
 
Eraldo Luiz Kuster mostra a evidente redução de direitos, ao dizer na audiência pública de 17.09.2009, realizada na Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal:
 
“A população brasileira não tem condições de custear esse atendimento para depois buscar o reembolso. Vedada a cessão de direitos em qualquer hipótese, se não tiver condições de pagar, ele terá que ser atendido pelo SUS, perdendo, portanto, a oportunidade de ter um atendimento que suporte o SUS e os prestadores de serviço não têm a devida contraprestação desse atendimento prestado. Essa alteração legislativa vedando a cessão de direitos trouxe dificuldades no processamento do pedido de reembolso porque para que a vítima tenha direito ao reembolso ela tem que primeiro desembolsar, tem que pagar, depois ela tem que percorrer uma verdadeira via crucis para obtenção da documentação necessária; em primeiro lugar, o boletim de ocorrência registrado, liberado pela autoridade policial competente; em segundo lugar, o relatório médico com a descrição do atendimento prestado, comprovação dos exames realizados, documentação pessoal e o pior, através também de uma MP em 2006, houve uma alteração na legislação onde foi inserido o § 6º, art. 5º, da Lei nº 6.194/1974, possibilitando a que a indenização fosse paga através de depósito em conta-corrente do beneficiário que sempre foi a vítima ou transferência eletrônica de dados (TED). O DPVAT indeniza aproximadamente 250 mil pedidos/ano e não se pode querer que limite a 250 mil cheques (ordens de pagamento) aos beneficiários. Mesmo antes da alteração da MP 340, ela já era na prática utilizada, só que isso agora com a vedação da cessão cria um impasse intransponível para o recebimento da indenização, quer pela vítima, quer para quem ela outorga a procuração, isso porque é uma exigência a abertura e indicação de uma conta-corrente para recebimento do reembolso”
 
A supressão da cessão de crédito torna impossível a atividade, quer de caráter filantrópico, quer de caráter comercial, exercida pelas instituições hospitalares e outras congêneres. Além do mais, a impossibilidade da cessão afetaria os princípios basilares do Código Civil Brasileiro, em especial os artigos 286 a 303, os quais definem acerca da cessão. A cessão de direitos está na essência do mais relevante princípio do direito privado que é o da autonomia da vontade.
 
Salientamos, que o direito de livre disposição de seus créditos relativos ao reembolso do seguro DPVAT está atrelado àquele da livre escolha do tratamento que o acidentado, assegurado pelo seguro obrigatório da rede hospitalar desejar e da qualidade do tratamento que pretender. No entanto, os pobres estão privados da livre escolha pela nova lei, sendo obrigados a receber o tratamento do SUS, por não poderem pagar, por antecipação, e receber depois o custo do tratamento. A Constituição Federal veda este tipo de descriminação, ou seja, estabelecer desigualdade entre os homens.
 
Conforme ensinamento do douto professor Ives Gandra da Silva Martinsa lei em comento, teria como propósito e efeitos beneficiar fundamentalmente os bons negócios das seguradoras, o legislador pretendeu confundir dois regimes jurídicos distintos, no que diz respeito ao DPVAT, em evidente prejuízo da grande maioria das entidades de saúde que não objetivam o lucro. Na melhor das hipóteses, o legislador decidiu que o interesse negocial é superior aos ideais filantrópicos, prejudicando os que prestam o atendimento hospitalar em benefício dos que obtêm lucros - e todas as seguradoras têm, nos seus balanços, ostentado lucros expressivos - ao transformar dois regimes jurídicos distintos em único regime para os efeitos que se propôs.
 
Destaco parte de seu parecer:
 
Esse § 2º do art. 31 da Lei 11.954/2009 fere o princípio da razoabilidade e o art. 196 da CF, ao reduzir direitos dos aqui residentes e das instituições filantrópicas, em benefício de empresas que objetivam exclusivamente o lucro decorrente das receitas obrigatórias de seguro do DPVAT. Vale dizer: os direitos assegurados em 05.10.1988 pela Lei nº 6.194/1974 - art. 12 - passaram a ser menores para acidentados e instituições sem fins lucrativos, em clara violação ao art. 196 da CF.[13]
 
Salientamos o § 3º do art. 31 da lei em questão, que tem a seguinte redação:
 
“§ 3º As despesas de que trata o § 2º deste artigo em nenhuma hipótese poderão ser reembolsadas quando o atendimento for realizado pelo SUS, sob pena de descredenciamento do estabelecimento de saúde do SUS, sem prejuízo das demais penalidades previstas em lei (NR)”.
 
A Constituição da República de 1988 consagra o referido princípio, expressamente, no caput do artigo 5º “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Ademais, o diploma magno labuta em prol da igualdade dos desiguais criando desigualdades, ou seja, por meio de alguns dispositivos promove uma aparente injustiça/desigualdade para administrar o princípio da isonomia
 
O referido princípio da igualdade amparado pela Constituição Federal de 1988 foi manifestamente dilacerado com referido diploma legal, pois cria tarifas diferentes para os acidentados que vão aos hospitais não conveniados com o SUS, que não só terão um tratamento personalizado, reconhecidamente melhor do que o ofertado aos pacientes do SUS, como os hospitais não conveniados poderão receber diretamente os valores efetivamente disponibilizados aos acidentados pelo DAMS.
 
O fato de ser credenciado ao SUS não pode impedir o prestador de fazê-lo de forma particular, é um juízo de oportunidade e conveniência existente entre o paciente e o prestador. Daí entender que o prestador fica impossibilitado de desenvolver sua atividade, assim como o paciente não dispõem de seu livre arbítrio para escolher a forma e a pessoa que estará por lhe atender.
 
É evidente que se o paciente, vítima de acidente de trânsito, optar pelo atendimento do SUS, o hospital ou médico deverão fazê-lo, em o podendo, porém, obrigar o paciente a receber o tratamento público quando tem o direito de receber atendimento privado, é caso claro de violação do direito do acidentado.
 
O artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, por sua vez, assegura o direito à indenização por danos decorrentes de ato ilícito. Essa indenização, entretanto, haverá de ser justa, de forma a assegurar a dignidade da pessoa humana, evitando haja o enriquecimento sem causa por parte de quem tem a obrigação de indenizar, no caso as seguradoras participantes do convênio. Evidente o enriquecimento das seguradoras que cobram o prêmio, mas não asseguram o risco, ou seja, dificultam a possibilidade do uso da indenização do seguro, agravando a situação do Estado que tem que manter o SUS. Está mais do que evidente que a reforma no “contrato” do seguro obrigatório só favoreceu a um sujeito, o segurador.
 
Sem consonância com os princípios de isonomia e livre iniciativa, tal alteração se mostra inconstitucional, e, mais ainda, não existe relevância e urgência para a via eleita para alteração legal, em discordância com o art. 62 da Carta Magna.
 
        Sr. Kasten vice-presidente da CNS (Confederação Nacional da Saúde) informou a Senado Federal, na audiência pública de 17 de setembro de 2009, que “com o advento da MP 451, de 16.12.2008, vimos a criação de um obstáculo à utilização do seguro DPVAT para atendimento médico-hospitalar, pois a referida MP proibiu a utilização do referido seguro pelas vítimas de acidente de trânsito socorridas em hospitais privados conveniados ao SUS, 90% das vítimas desconhecem a utilização do DPVAT. A MP 451, cuja vigência perdurou até 05.06.2009, simplesmente inviabilizou o uso do DPVAT[14], pois se verificou que a imensa maioria, senão todos, dos hospitais brasileiros que oferecem atendimento DPVAT são filantrópicos, santas casas, etc., que são conveniados ao SUS. Portanto, praticamente, não houve a utilização do DPVAT para ressarcimento do DAMSP no período de 16.01.2008 até 05.06.2009. A MP 451 foi convertida pela Lei nº 11.945, de 04.06.2009, e alterou sua redação igualmente para invocar, inovar as regras e criar dificuldades para o uso do DPVAT pelas vítimas de acidente de trânsito”.
 
Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) DE 2009 estimam que o custo dos acidentes rodoviários no Brasil chega a R$ 22 bilhões por ano, somando gastos médicos, hospitalares, de perda de renda, remoção e recuperação de veículos, administrativos, judiciais e previdenciários. Desse total, cerca de R$ 9,8 bilhões são custos médicos e hospitalares, pagos pelo Ministério da Saúde.
 
Da infância promissora, não tardou em ver o seu benefício social transformar-se num longo pesadelo. Criado para socorrer as vítimas dos acidentes de transito, acabou por fazer os beneficiários novas vítimas, dificultando a reparação dos danos ao invés de minorá-los. Não somente sofreu uma destrutividade em todos os sentidos, como até desgastou a um ponto indesejável, perigoso, a imagem do seguro em geral.
 
 Os números de atendimento pelo seguro DPVAT reduziram cerca de 7 vezes só de 2008 apara 2009 no seu primeiro trimestre, conforme dados da CNS, o que por evidencia onerou abruptamente o SUS, pois os números de acidentes só aumentam. Com isso, o governo quer aumentar os impostos, criando a CSS (Contribuição Social para Saúde), ou seja, quem ganha com tudo isso são as seguradoras e quem perde duplamente é o povo.
 
Se os hospitais que são credenciados ao SUS dão atendimento em caráter particular e a convênios, porque que eles não podem atender as vitimas que optarem por serem atendidas em caráter particular utilizando o DAMS (despesas de assistência médicas e suplementares)? Se é obrigatório o pagamento do Bilhete do Seguro Obrigatório DPVAT, temos que ter o direito de escolha, se não podemos usar uma coisa que pagamos isso fere o direito nosso de consumidor.
 
Necessário que os legisladores atentem para procedimentos mais adequados quando da elaboração ou modificação das leis, sob pena de a sociedade ficar totalmente marginalizada, o que sem dúvida se constitui em um verdadeiro retrocesso legislativo, precipuamente, em sede de legislação ordinária. A lei tem que ser clara, harmônica, não pode amparar texto diferente ou estranho a seu propósito.
 
Lembramos que está não foi a única alteração imposta pela medida provisória nº451 de 2008.  Além, da referida imposição a nova lei impôs uma graduação à lesão, em outras palavras, o legislador quantificou a indenização conforme a extensão do dano e o membro invalidado, assim, após a MP a indenização passou a ser determinada por um cálculo da indenização vinculado a uma tabela criada para graduar a invalidez.
 
Antes dessa alteração legislativa as seguradoras já alegavam que o valor indenizatório deveria ser conforme uma tabela constante em resolução emitida pela Susep, porém vários tribunais pátrios já tinham fixado entendimento de que referida tabela carecia de legalidade, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul era unânime quanto a está questão, e, por isso, não poderia ser utilizado como forma de cálculo da indenização pecuniária a ser paga.
 
A maior das injustiças dessa nova tabela de invalidez é por conta das gritantes distâncias que poderão surgir entre a "invalidez tabelada" – proposta pela MP 451 – e a invalidez real, efetiva. É evidente que a tabela imposta pela Medida Provisória 451 não respeita a finalidade da Lei 6194/74, pois vai contra o seu principal objetivo, que era minimizar o sofrimento do acidentado neste momento complicado,a indenização não tem o condão de funcionar como verba indenizatória ou reparatória, mas tão somente ajudar o necessitado em momento do infortúnio. 
 
A tabela impôs uma quantificação ao corpo humano, o que é vedado pela Constituição Federal de 1988, assim temos que o valor para uma perda é de 35% sobre o valor máximo indenizável, enquanto que a Perda auditiva total bilateral (surdez completa) ou da fonação (mudez completa) ou da visão de um olho é de 50% sobre os R$13.500,00 (treze mil e quinhentos reais). Referidos patamares foram retirados de uma antiga tabela emitida pela SUSEP já utilizadas pelas seguradoras. Se a intuição era reparar ou dano, a tabela também não encontra respaldo, se não vejamos:
 
Imagine-se o caso, por exemplo, de um jogador profissional de futebol, um goleiro que tem uma de suas mãos severamente afetada por um acidente de trânsito, tornando-o totalmente inválido para o desempenho de sua profissão habitual, a qual é exercida há anos e é o único sustento de sua família. Seguindo-se os critérios da referida tabela, somente fará jus ao recebimento de 35% do valor indenizatório (70% x 50%), ou seja, a R$ 4.725,00, num caso em que sua invalidez real, efetiva, é de 100%. Evidente, assim, que referida alteração legislativa só acarretou em modificações negativas ao segurado.
 
Concluímos após este longo arrazoado que as leis aqui abordadas foram em confronto com a lei que regula e orienta o seguro obrigatório, ou seja, nada foi feito para facilitar, ao contrário muito foi feito para dificultar o recebimento da indenização. Por derradeiro, o aspecto social, em mitigar a tragédia pessoal do acidentado, inserido na lei é violentamente substituído pelas leis de mercado, do mercado segurador, e o pior de tudo que foi colaborado pelo Estado. 
 
Difícil entendermos o porquê do Governo Federal reduzir a indenização do seguro obrigatório de 40 salários mínimos para R$ 13.500,00 em benefício exclusivo das seguradoras, a não ser se concluirmos pela assertiva acima.
 
Finalizamos apontando que a lei que ampara o seguro DPVAT, foi amplamente condenada ao fracasso ao longo dos últimos anos com as reformas impostas pelas Medidas Provisória nºs 340 e 451, evidente o desvio de sua finalidade, das falhas e da morosidade na aplicação da referida lei. Conforme destacamos nada foi feito para facilitar, agilizar ou até mesmo impor medidas de segurança contra fraudes ao sistema, pelo contrário dificultaram em tudo, e assim não foi necessário do investimento em segurança.
 
O seguro DPVAT, conforme destacamos é um ilustre desconhecido, tanto pela população como para muitos operadores do direito. Apesar do seu desconhecimento, ficou evidente que o benefício deste seguro é muito amplo não Se restringindo aos acidentados como também a toda sociedade, ao passo que grande parte da verba arrecada vai para o SUS. E que se não tivesse sido alterado grande percentual dos acidentados não agravariam a situação do SUS, pois seriam atendidos em caráter particular, como conveniados a um seguro privado,no entantoessa migração de pacientes DPVAT, imposta pelo MP 451, assoberba ainda mais o sistema público de saúde, gera despesas ao Erário, responsável pelo financiamento da saúde, beneficiando, exclusivamente, as seguradoras.
 
Há pouco mais de cinco anos quase não se ouvia falar do DPVAT, a não ser quando a mídia divulgava mais um esquema de desvio de verbas que deveriam ir para as vítimas e para a saúde pública, mas que acabavam em mãos erradas. No entanto com o aumento de ações no judiciário as pessoas foram tomando maior conhecimento sobre o assunto (alega o Governo Federal que entre os anos de 2003 e 2007 o aumento foi de 1.300%) e com isso as alterações legislativas foram surgindo.
 
O que nos leva a concluir que como as seguradoras conveniadas não conseguiram fazer valer sua vontade nos processos judiciais, passou a lançar mão de seu maior trunfo quando o Judiciário interpreta a lei de maneira que não lhe convém, em outra palavras as seguradoras com apoio do Governo Federam modificaram a lei, para se beneficiar.
 
Acreditamos que as alterações legais tornaram ineficaz e inepto grande parte do seguro DPVAT, pois referidas medidas impostas a este seguro deformaram seu originário objetivo. O seguro que tinha um cunho totalmente social, foi extremamente alterado e prejudicado por leis, ao nosso ver inconstitucionais.
 
Referido tema merece maior atenção dos julgadores, doutrinadores e aplicadores do direito, é um assunto que atinge mais de 150 milhões de brasileiros do extremo sul ao extremo norte. Concluímos que uma simples análise aprofundada deste seguro é capaz de responder a todas as divergências imposta ao tema e sem dificuldade terminamos que o seguro apesar de crescer em aspectos econômicos reduz constantemente sua finalidade, que é dar o mínimo de amparo ao acidentado. Não podemos deixar que acabem com um seguro de vital importância que é o DPVAT à nossa sociedade.
 

[1]             NOGUEIRA, Paulo Lúcio, seguro obrigatório, prática, processo e jurisprudência V. 32, Curitiba, Juruá, 1978. Pag. 12.
[2]             MARENSI, Voltaire, O Seguro no Direito Brasileiro. 2009.
[3]             Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 52.158/rs. Relator Ministro da câmara
[4]             Martins, Rafael Tárrega, Seguro DPVAT. Seguro obrigatório de veículos automotores de vias terrestres. 4. ed. Campinas: Servanda, 2009. p.  9/10.
[5]           Merensi, Voltaire Giavarina, O Seguro, a Vida e sua Modernidade,Rio de Janeiro; Lumen Juris, 2008, p. 140.
[6]             Merensi, Voltaire Giavarina, O Seguro, a Vida e sua Modernidade, Rio de Janeiro; Lumen Juris, 2008, p. 141.
[7]             Martins, Rafael Tárrega, Seguro DPVAT. Seguro obrigatório de veículos automotores de vias terrestres. 4. ed. Campinas: Servanda, 2009. p.  9/10.
[8]              Martins, Rafael Tárrega, Seguro DPVAT. Seguro obrigatório de veículos automotores de vias terrestres. 4. ed. Campinas: Servanda, 2009.
[9]SITE WWW.FABIOCAMPANA.COM.BRARTIGO VEICULADO EM 22.12.2008 MP retira recursos da saúde em favor de seguradoras.
[10]         MARTINEZ , Wladimir Novaes, A seguridade social na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: LTr, 1992. p. 91.
[11]         Oscar Dias Corrêa esclarece: “Os arts. 193 e seguintes constituem o último Título da Constituição, dedicado à Ordem Social, que ‘tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais’. Esse simples enunciado permite ver que se trata de título amplamente programático, incluindo os Capítulos da Seguridade Social (com as Seções de Saúde, Previdência Social e Assistência Social); da Educação, da Cultura e do Desporto (com as Seções respectivas), da Ciência e Tecnologia, do Meio Ambiente; da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso, e, por último, dos índios. Em síntese, afirma-se o dever do Estado de assegurar esses benefícios da ordem social, direito de todos e de cada um, implementando políticas que o garantam, desenvolvendo ações que o possibilitem, canalizando, ao lado da atuação do setor público, a colaboração da sociedade. Reconhecendo seu dever primordial, o Estado orientará as ações, além de atuar no sentido de convocar a sociedade, como um todo, e os particulares - cada um na área de seus deveres sociais ou individuais - a colaborar na grande obra comum” (A Constituição de 1988 - contribuição crítica. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991. p. 234).
[12]            MARTINS, Ives Gandra da Silva, Vedação da Cessão de Direitos Relativos ao Seguro DPVAT Imposta pela Lei Nº 11.945/2009 para Reembolso de Despesas Hospitalares em Caso De Acidentes, Revista Seguros, 2010.
[13]         MARTINS, Ives Gandra da Silva, Vedação da Cessão de Direitos Relativos ao Seguro DPVAT Imposta pela Lei Nº 11.945/2009 para Reembolso de Despesas Hospitalares em Caso De Acidentes, Revista Seguros, 2010.
[14]            O princípio do acesso universal igualitário fica maculado, com evidente prejuízo para o paciente pobre, que não terá como antecipar o pagamento para ser reembolsado e não terá escolha de ir para o hospital que desejar, apesar de o seguro ser o mesmo para ricos e pobres e hospitais conveniados ou não. O princípio do acesso universal igualitário não vige, segundo a Lei nº 11.945/2009, para hospitais de melhor qualidade não conveniados - restringidos, assim, a quem tem recursos financeiros.
Autor: Bruno Farias Mallmann

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